sexta-feira, 9 de julho de 2010

Justina

Num tempo em que o tempo não tinha pressa
E a vida não era urgente 
Ela nasceu, amou, cantou e teve filhos.
Diz a lenda que não rejeitava uma "branquinha"
mas só de vez em quando, 
como convinha a uma senhora de respeito 
nascida nos idos de 1904.
Fico às vezes tentando adivinhar
Quantos segredos escondia
No que pensava quando sentava na calçada
Com o olhar distante...
Nas suas palavras, os livros de história ganhavam vida
Uma vez eu disse a ela que quando crescesse iria ser comunista
“pelamordedeus, deixe disso menina
comunista mata criança e depois come”
É doce lembrar das nossas brigas
“vem já  pra dentro,
Jogo de pedra é brincadeira do cão”
“ deixa de ser desobediente, larga essa bola,  menina não brinca dessas coisas!”
E só ela tinha o direito de interromper meus banhos de chuva
Ganhei dela um violão
E alguns cascudinhos  leves
(não necessariamente nessa ordem)
Minha avó. 
Cabelos brancos, pele branca.
Alma não tem cor, mas se tivesse a dela seria laranja. 
Amarelo resplandecente, cheio de luz
Temperado com gotinhas vermelhas de pimenta.

(Para minha avó e segunda mãe. 2006, seis anos após sua morte) 

3 comentários:

Leila disse...

Lili,esse seu poema sobre vovó Tina me fez lembrar...na verdade pude senti-la sentadinha naquela cadeira,cabelo bem branquinho e liso,bem gordinha como toda avó que se preza deve ser.Cheguei a sentir o seu abraço,estou quase chorando de saudades.Imagino o quanto seria bom se os meus meninos chegassem a conhce-la,a a escutar as suas histórias...Sou toda saudades...

Ribamar Lopes disse...

Oi Lisandra, entre tantos escolhi este para comentar, pois é a nossa fonte em comum.

Lembraria outra fala dela..."decá isso menino!"

Parabéns por suas postagens.

Lisandra disse...

ô, riba...
É verdade. E tinha outra muito boa. Ela pedia que a gente fosse pegar alguma coisa, fazer um mandado...e se a gente não ia ela falava: "dêstá, menina..."
Pra mim "dêstá" era "dêstá" mesmo, nunca tinha procurado saber o que significava. Aí muito tempo depois, ouvindo "Let it be", dos Beatles, tive a "iluminação". O velho dêstá de vovó era "deixe estar, menina!!!"