terça-feira, 20 de julho de 2010

Para que servem os livros?

Ultimamente tenho visto discussões sobre internet e “emburrecimento”. 
Vim ter acesso à rede quando já estava na faculdade, por volta de 1997/1998, depois de comprar um computador com o dinheiro da bolsa de estágio. Se por um lado hoje não imagino a vida sem internet, por outro é indiscutível que ela está causando um tremendo mal para quem já nasceu com o “google” à disposição e se acostumou a um mundo restrito a 140 caracteres. 
A propósito desse assunto, saiu na revista “Isto é” desta semana uma reportagem intitulada “Torpedos literários”, falando de uma versão “supercondensada” de obras primas da literatura, que resume 90 livros, chamada de “Twitterature”. 
Transcrevo a seguir um trecho dessa reportagem: “o aparecimento desses livros aponta para dois fenômenos da atualidade. O primeiro é o reconhecimento de que os grandes livros pertencem definitivamente ao passado; o segundo é a sensação de que, nessa época de incessante informação on-line, as pessoas não estão encontrando tempo para conhecê-los”. 
É evidente que, hoje em dia, diante das múltiplas atividades de crianças, jovens e adultos, o tempo realmente é menor. Mas isso não significa que não exista tempo para os livros. Ora, se as pessoas podem passar duas/três horas por dia vendo “vídeos engraçados” no youtube, “imagens divertidas”, PPS recebidos por email, ou então digitando bobagens no twitter, enviando asneiras pelo orkut, facebook e afins, lendo cinco jornais on line (invariavelmente com as mesmas notícias) fica mesmo impossível conseguir ler.  Então se vê que tudo não passa de uma questão de prioridade. 
Não acho que um bom livro tenha que ser necessariamente grande; mas existem milhões de coisas que não podem ser ditas em apenas 140 caracteres. 
No Twitterature  “O estrangeiro”, de Camus,  é resumido assim:
Mersault é um camarada existencial que não acredita em nada. Ele pode suar, mas não chora no funeral da mãe. Certo dia de sol, Mersault mata um árabe na praia inspirando uma música do Cure. Ele pega a pena de morte e fica consolado quando percebe que o universo não se importa com qualquer um de nós. Isso deixa a gente feliz.” 
Com perdão pela expressão, mas que porra é essa? Não é uma historinha linear que faz de “O Estrangeiro” um grande livro. São os diálogos, são as entrelinhas...às vezes cabem dezenas de reflexões em um único diálogo. Isso com Camus e com todos os bons autores. 
Segundo a reportagem, Alexander Aciman, co-autor do Twitterature, ainda diz: “existem pessoas que nunca vão conhecer Marcel Proust ou James Joyce e, nesse caso, nosso trabalho oferece uma pequena porção dos romances desses autores. É infinitamente melhor ter acesso a esse aperitivo do que nunca ter ouvido falar deles.
Então o livro, segundo esse rapaz, serve apenas para dar um verniz cultural. Pra que o sujeito não fique boiando na conversa quando se falar em Proust. Eu nunca terminei de ler Proust, mas prefiro a dignidade da minha ignorância a esse tipo de engodo. 
Além disso, existe o prazer de ler, de descobrir estilos, de apreciar cada página. A leitura de um bom livro é uma viagem em que nem sempre o melhor é a chegada.  Como disse Paulinho Moska, “então me diz, qual é a graça de já saber o fim da estrada, quando se parte rumo ao nada?


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