quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Quem sabe a vida é não sonhar

 Minha vó já me dizia: pára de fingir que não repara nas verdades que eu te falo, dá um pouco de atenção, menina. Ouça-me bem, amor, preste atenção, o mundo é um moinho, vai triturar teus sonhos tão mesquinhos, vai reduzir as ilusões a pó. Pois quem espera que a vida seja feita de ilusão, pode até ficar maluco ou morrer na solidão. É que nem sempre o amor é tão azul. Então ouça um bom conselho, eu te dou de graça: sonhar só não dá em nada; o destino do amor é sempre a despedida. 
Juro que não acreditei. Eu achei que a vida fosse bela . Quando eu vim pra esse mundo, eu não atinava em nada. Eu nasci assim, eu cresci assim. Acreditando na ilusão. 
E quando te vi, tendo que viver comigo apenas e com o mundo, você me veio com um sonho bom. Me perdi de tanto amor, ah, eu enlouqueci. Ninguém podia amar assim e eu amei. Dei pra sonhar, fiz tantos desvarios...rompi com o mundo, queimei meus navios. Vi um grande amor gritar dentro de mim como eu sonhei um dia. Foi assim: nos amamos feito dois pagãos. Fiz de você o sol da noite primordial e o mundo fora nós se resumia a tédio e pó. Tinha cá pra mim, que agora sim, eu vivia enfim o grande amor.
Mas existem coisas na vida das quais até Deus duvida. Quando o meu mundo era mais mundo, quando a poesia realmente fez folia em minha vida, você partiu e me deixou. Você partiu para ver outras paisagens. Nunca mais você voltou pra me tirar da solidão. Partiu. Me disse pra ser feliz e passar bem. Chorei, chorei...até ficar com dó de mim. Amaldiçoei o dia em que te conheci.
 “Pelo amor de Deus
Não vê que isso é pecado, desprezar quem lhe quer bem??”
Pouco adiantou.
Você me deixou, meu bem. Ah, coração leviano, não sabe o que fez do meu.  Desde então, minha história é esse nome que ainda hoje carrego comigo: saudade. A saudade é o pior tormento, é pior do que o esquecimento, é pior do que se entrevar. Você sabe o que é ter um amor, meu senhor? E por ele quase morrer? Eu perco o chão, eu não acho as palavras.  De repente a gente vê que perdeu ou está perdendo alguma coisa morna e ingênua que vai ficando no caminho. Só sobraram restos. Hoje meu coração é só saudade, vive adversidade, a tristeza mora em mim. Ando tão à flor da pele, qualquer beijo de novela me faz chorar. Eu já não consigo mais viver dentro de mim e viver assim é quase morrer . Há tempos o encanto está ausente. Inutil dormir, a dor não passa.  Sou fera ferida, no corpo, na alma e no coração. Meu coração tropical está coberto de neve. Porque só me ficou da história triste deste amor a história dolorosa de um fracasso. 
Desilusão, desilusão... A vida não é brincadeira, amigo. Tanta gente aí se engana, e cai da cama com toda a ilusão que sonhou. E você que está me ouvindo, quer saber o que está havendo com as flores do meu quintal? O amor-perfeito, traindo, a sempre-viva, morrendo, e a rosa, cheirando mal. 
Agora falando sério....filosofia ou poesia é o que dizia a minha vó! O mundo é um moinho! São demais os perigos desta vida. Quanto tempo de sonho perdido, quanto tempo esquecido, é melhor nem lembrar. Mas agora eu sei o que aconteceu. Me cansei de ter ilusão . Tudo o que se ganha nessa vida é pra perder. Tem que acontecer, tem que ser assim. Nada permanece inalterado até o fim. Viver não é brincadeira não!  Chegar e partir são só dois lados da mesma viagem. Solidão é lava que cobre tudo.  Desilusão, desilusão. Já conheço os passos dessa estrada , sei que não vai dar em nada. Eu cansei de ser assim, cansei de procurar o pouco que sobrou. Quem sabe o amor – todo amor que houver nessa vida – tenha chegado ao final. Quem sabe a vida é não sonhar. 


(texto construído com letras de músicas brasileiras. As únicas exceções são as palavras em negrito. Tem Chico Buarque, Roberto Carlos, Paulinho da Viola,  Lupicínio Rodrigues, Cazuza, Cartola, Renato Russo,  Zeca Baleiro, Adriana Calcanhoto, Erasmo Carlos, Raul Seixas, dentre muitos outros. O título é trecho da música malandragem, de Cazuza/Frejat)

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